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Madeiras: como escolher a melhor opção para envelhecer sua cachaça e potencializar o sabor

A cachaça é uma bebida tipicamente brasileira, é reconhecida como o primeiro destilado das Américas. Sua produção teve início ainda no Brasil colonial, por volta de 1520, no estado de Pernambuco. Atualmente a aguardente é comumente envelhecida, mas no início, não era uma prática comum. A técnica de envelhecimento foi descoberta por acaso durante a corrida do ouro em Minas Gerais. A bebida era transportada em barris de madeira e, ao chegar ao seu destino, notaram que a cachaça adquiria uma nova coloração, além de um aroma e sabor mais suaves.

O envelhecimento é um processo que aprimora a qualidade química e sensorial do destilado, permitindo que o produto seja armazenado em barris de madeira por um período adequado para que ocorram reações específicas, suavizando o sabor intenso de álcool das bebidas recém-destiladas. A duração necessária para que essas reações se efetivem pode variar conforme a espécie de madeira utilizada.

Os compostos responsáveis por alterar as características olfativas e gustativas são os congêneres voláteis cuja concentração e composição variam de acordo com a espécie de madeira empregada para o envelhecimento. O uso de diferentes tipos de madeiras além de alterar as qualidades sensoriais, também impacta diretamente os químicos que compõem a cachaça. Vários destes compostos apresentam teores distintos em função da armazenagem como, acidez volátil, teor alcoólico, extrato seco, entre outros que influenciam a percepção do consumidor final.

O carvalho é a madeira mais comum e bastante estudada para o envelhecimento da cachaça. Mas, na verdade, existem mais de 30 tipos de madeiras que podem ser usadas nesse processo. Cada uma delas traz uma variedade de cores, sabores e aromas diferentes para a bebida. Entre essas opções estão a amburana, o jequitibá-rosa, o amendoim, o bálsamo, o ipê, o freijó, a castanheira e muitas outras. Essa diversidade de madeiras ajuda a criar sabores únicos e especiais na cachaça.

O carvalho que pertence ao gênero Quercus é a madeira mais usada no processo de envelhecimento de bebidas alcoólicas, sejam elas fermentadas ou destiladas. O carvalho americano (Quercus alba), que se desenvolve em várias regiões dos Estados Unidos, assim como o carvalho europeu Quercus petraea conhecido como carvalho séssil e o Quercus robur – chamado de carvalho pedunculado, são as espécies mais utilizadas na fabricação de barris para envelhecimento de destilados.

No aspecto sensorial, as cachaças que são armazenadas ou envelhecidas no carvalho americano apresentam cor dourada, aromas com notas de baunilha e coco, sabor suave e com um buquê aromático complexo. Por outro lado, a cachaça envelhecida ou armazenada em carvalho europeu adota cor âmbar, aromas e sabores intensos, com características de amêndoas, nozes, castanhas, madeira tostada e taninos.

A amburana também chamada de cerejeira (Amburana cearensis) pertence à família das leguminosas, e se estende do estado do Ceará até o norte da Argentina. É amplamente utilizada na região Nordeste, especialmente em marcenaria, na confecção de móveis de alta qualidade, esculturas e diversas outras aplicações. A madeira possui densidade moderada, com cerne em tons bege amarelado ou rosado, apresentando resistência mecânica que varia de baixa a média.

A cachaça envelhecida em amburana apresenta cor intensa, sabor adocicado e um buquê aromático forte e característico, com notas frutadas e um toque evidenciado de especiarias.

O jequitibá-rosa (Cariniana legalis) é uma espécie nativa do Brasil, reconhecida pela sua tonalidade bege-rosada, que pode variar para tons mais escuros. Esta madeira é moderadamente pesada, macia e bastante durável. Usa-se na confecção de tabuados, artigos escolares, caixotaria e compensados, assim como na produção de barris para o envelhecimento. A cachaça que passa por um envelhecimento em barris de jequitibá-rosa ganha uma coloração dourada e desenvolve aromas e sabores agradáveis, criando um buquê aromático que lembra o carvalho americano.

O bálsamo (Myrocarpus frondosus) é uma espécie nativa do Brasil e famosa por sua resistência, o que a torna perfeita para a produção de móveis e na construção civil. No sul da Bahia, essa planta é utilizada como afrodisíaco na cachaça. Quando envelhecidas ou armazenadas em barris de bálsamo, as cachaças adquirem uma coloração amarelo-esverdeada, um aroma marcante de ervas e um sabor sutilmente apimentado.

Independente da madeira escolhida, a cachaça produzida deve atender aos padrões estabelecidos pela Normativa Nº 13, de 29 de junho de 2005. Isso garante que, quando consumida em doses adequadas a cachaça não cause danos à saúde do consumidor. Assim, a bebida deve apresentar teor alcoólico de 38 – 48%, acidez volátil máxima de 150 mg/100 mL, álcoois superiores mínimo de 150 mg/100 mL, teor de cobre máximo de 5 mg/L, entre outras especificações necessárias.

Portanto, a escolha do material para armazenar a cachaça influencia diretamente no produto final, alterando suas propriedades organolépticas. Embora o carvalho seja o mais popular, várias madeiras podem ser utilizadas na fabricação. Ao selecionar o material para os barris de envelhecimento, é fundamental considerar tanto o resultado desejado quanto a madeira que é mais acessível e adequada para a produção.

Texto: Ian Lucas Godoi Bottene / Casa do Produtor Rural – ESALQ
Revisão: Drª Aline Bortoletto – Pesquisa e Desenvolvimento de bebidas/ InovBev

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